Entrevista dado pelo Cardeal Cañizares ao jornal católico alemão Die
Tagespost, por ocasião do 3º aniversário do motu proprio Summorum Pontificum.
Três anos após a publicação do Motu Proprio Summorum Pontificum, o Prefeito
da Congregação Romana para o Culto Divino faz o balanço geral.
Por
Regina Einig
Eminência, o Papa, na carta aos bispos do mundo, falou, no que diz respeito
às primeiras conversas antes do Motu Proprio Summorum Pontificum, de alegre
aceitação ou de declarada oposição. O clima mudou desde então?
O
clima permaneceu essencialmente o mesmo. mas eu acredito que um movimento está
a caminho. Entende-se bem melhor agora sobre o que era o Motu Proprio. A
compreensão da liturgia na tradição da Igreja cresceu. O mesmo é verdade para a
hermenêutica da continuidade. Tudo isto beneficiará não somente a aceitação e
implementação do motu proprio, mas também enriquecerá a renovação litúrgica e a
porá em prática - no sentido de que o espírito da liturgia está vivo novamente.
Na França, dois seminários diocesanos formam os seminaristas nas duas
formas do Rito Romano. O que pensa deste modelo?
Há
apenas uma liturgia. Consequentemente as duas formas da celebração do rito
romano cabem bem na mesma formação, precisamente porque são uma e a mesma
liturgia. É importante notar que a Igreja, por causa da hermenêutica da
continuidade, não congela o Missal de João XXIII, mas também não rompeu com
ele. A tradição da Igreja também está integrada no desenrolar do Concílio
Vaticano Segundo. Portanto, a educação litúrgica para todos deverá estar na
linha da Sacrosacntum Concilium. Dadas as riquezas do Rito Romano na sua
inteira tradição - o que inclui o Missal de João XXIII e a reforma litúrgica
pós-conciliar - ambos não podem ser postos um contra o outro. Eles são
expressões da mesma riqueza litúrgica.
O senhor compartilha da visão do Bispo de Toulon, que considera ideal
formar os seminaristas nas duas formas?
O Bispo
de Toulon, um homem excelente, deseja visualizar a inteira tradição da Igreja à
luz da hermenêutica da continuidade. E desde que a Sacrosanctum Concilium é
válida, ele implementa esta formação, única na forma, na qual a celebração é
ensinada em ambas as formas do Rito Romano. Os bons frutos em Toulon são
evidentes.
Que elementos da forma extraordinária podem também ser integrados na forma
ordinária do rito?
O
senso de mistério e de sagrado, e sobretudo o senso do significado do Reino de
Deus. Trata-se da grandeza de Deus e do mistério de Deus. O homem realmente é
sempre indigno de partilhar do dom divino da liturgia. Precisamos novamente
reconhecer o direito de Deus, o "ius divinum", o quanto antes melhor.
Hoje em dia a liturgia normalmente aparece como algo a que o homem tem direito
e no qual ele age. Isto reflecte a secularização de nossa sociedade, enquanto
outros aspectos vão sumindo em meio a isso. Isso tem levado a reforma do
Concílio Vaticano II a não descobrir sua riqueza e grandeza como esperado.
O que o senhor recomenda aos sacerdotes? Por onde deveriam começar?
Os
padres deveriam preparar-se para a Missa como na forma extraordinária. O mesmo
vale para o rito penitencial e a consciência de que somos essencialmente
indignos da celebração, mas colocando nossa confiança na misericórdia e no
perdão de Deus e assim aproximarmo-nos da presença de Deus na celebração. Um
tesouro que nós não devemos esquecer é o ofertório como descrito nos textos das
orações [na forma extraordinária], que expressam uma atitude profunda.
Deveríamos interiorizá-la.
Na sua carta aos bispos o Santo Padre sublinhou que o seu objectivo com o
motu proprio é a reconciliação interna da Igreja. O que o senhor pensa sobre o
debate das ordenações ilícitas da Fraternidade São Pio X?
As
ordenações são um elemento incisivo num momento de graves decisões. Teria sido
desejável adiar as ordenações, porque se um dia há uma oportunidade real para
uma abertura e uma possibilidade de acordo, esta oportunidade pode ser
dificultada pelo fato de as ordenações [terem sido realizadas].
Em relação ao Dia Mundial da Juventude em Madri, em 2011: o que o senhor
recomenda aos jovens têm curiosidades acerca da Missa antiga?
Os
jovens devem ser educados no espírito da liturgia. Seria um equívoco comprometê-los
com uma ou outra forma de um jeito polémico. Eles precisam ser introduzidos à
adoração e ao espírito do mistério. Louvor e acção de graças deveriam ser
ensinados a eles - e tudo mais que constituiu a celebração litúrgica da Igreja
ao longo das gerações. Hoje os jovens precisam sobretudo de educação litúrgica,
não importando a forma que defendam particularmente. Esta é a grande mudança
para o futuro próximo, também para a Congregação para o Culto Divino e a
Disciplina dos Sacramentos. Hoje precisamos de um novo movimento litúrgico,
como houve nos séc. XIX e XX. E isto não é sobre uma ou outra forma, mas sobre
a liturgia como ela é.
E como pode este novo movimento litúrgico se tornar uma realidade?
Precisamos
de uma nova introdução à Cristandade. Também as crianças e os jovens. Uma
introdução à liturgia não significa apenas saber sobre a celebração, embora, é
claro, isto seja indispensável do ponto de vista doutrinário e teologal. Os
jovens e as crianças deveriam participar de liturgias celebradas com grande
dignidade, as quais devem ser inteiramente permeadas do mistério de Deus no
qual cada um se entende incluído. Participação activa não significa fazer algo,
mas adentrar o culto e o silêncio, o ouvir e também a prece de súplica e tudo
que realmente constitui a liturgia. Enquanto isso não acontecer, não haverá
renovação litúrgica. Temos que dar um giro de 180°. Um ministério para a
juventude deveria ser um lugar onde toma lugar um encontro com o Cristo vivo na
Igreja. Onde Jesus Cristo aparece como alguém de ontem, não é possível haver
qualquer educação litúrgica ou participação activa. Enquanto a consciência do
Cristo vivo não despertar novamente, nada acontecerá da tão esperada renovação.
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